segunda-feira, 8 de setembro de 2014

ATIREI MINHA VAQUINHA NO PRECIPÍCIO

Pode ter sido o escandaloso por do sol: tarde de outono, fresca e iluminada em todos os matizes possíveis. Fiquei da minha mesa, paralisada por alguns minutos, observando o vasinho branco repleto de rosas pequenas. Rosas. Elas estão gostando do clima: fresco, seco, cheio de luz. Além da pequena platibanda do terraço, se destaca ao fundo, depois de telhados parciais e fios invisíveis, o céu azul, azul. Estava muito agradável, a tarde; ainda mais que eu acabara de enviar algumas mensagens eletrônicas definitivas. Era tempo, talvez tarde, talvez. Creio que não teria o mesmo efeito se fosse em outro momento. Estava quase feliz, o que ainda não me atrevia. Era cedo; e haveria consequências. Minha filha caçula subiu a escada e eu, com as mãos sobre os cabelos lisos deixei sair pela minha boca algo que eu queria dizer há muito tempo: anos, muitos. “Pedi para sair”, num fôlego único, esfarrapado, com traços de rouquidão. Eu tinha pensado muito; e, como poucas vezes na vida, me atirei ao precipício. “Pedi para sair” e minha filha me olhou surpresa, quase sem entender o que eu dizia. Pedi para sair do emprego que paga as contas da casa. As mensagens informando isso à escola tinha seguido o caminho virtual e deveria em breve produzir efeitos desconhecidos. Foi um semestre letivo digno da mais cruel câmara de tortura. O desrespeito por professores é algo doloroso a ponto de os alunos determinarem o que querem estudar. Comentários, olhando no olho da gente, como “essa aula é chata demais!”. Perca tudo, mas não perca o bom humor alguém disse. Eu, me debatendo nas ondas de decepção que me arrastavam para o rés da autoestima, insistia em achar que todas as coisas estavam bem e que tudo iria melhorar, que tudo nem era tão ruim assim. Então, decidi que pode-se perder tudo mas não o último rasgo de dignidade. Quando outro aluno me chamou de velha na sala de aula, vi que estava forçando a barra. Pedi ao Coordenador para me substituir, mas isso não aconteceu. Engoli o amargo da vida inteira e resolvi terminar o período letivo. Não melhorou muita coisa depois disso, e foi pisando dolorosamente sobre cada pedra da escola que continuei a tarefa. E, eis que se avizinha o final do período letivo, Coordenadores já organizam a grade do próximo período, é, pois, a hora certa de dizer o que estava querendo brotar de mim inteira não quero mais ser professoraaaaa!!! Hoje, quando os e-mails dos coordenadores pediam que marcasse minhas disponibilidades, não tive escolha senão avisar que não continuaria. Confesso que o alivio não foi tão grande: outras preocupações substituíram essa. Como vou fazer para pagar as contas, por exemplo. Por Magda Castro Brasília/DF, 16/05/2014

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