sexta-feira, 3 de agosto de 2012

DE FLORES… E DE PÓ!

É assim o inverno de Brasília. Quem quiser pode ver o cuidado com as plantações dos canteiros, no que sempre penso enquanto imagino os rostos anônimos voltados para a terra vermelha fazendo o trabalho de cavar os buracos, milhares, e introduzir, gentilmente, a muda franzina da pata de vaca, do ipê, da sibipiruna, da manga, das amoras, das jacas, das primaveras, das gurumixamas, dos hibiscos, das barrigudas... Brasília tem esses contrastes, típicos dela. Ora é branca e pura na sua esperança infinita, ora é suja e poeirenta nos seus porões e obscuridades; e sua realidade nem sempre tem esses mesmos significados. Brasília futurista é cartão postal mas entendida pelos que vivem sobre suas avenidas longilíneas como mistura de benção e maldição. Também isso a torna cativante e a transforma em algo tão vivo e orgânico quanto qualquer outro ser fincado no solo farturento. Abertas suas entranhas, o céu límpido se enevoa de vermelho e fica, às vezes, a confusão de quem não a conhece: está nublado, vai chover; engano. Mesmo que as nuvens, nem sempre de vapor d’água ou políticas, se mostrem pelas muitas abóbadas, não obrigatoriamente cairão pingos de chuva. Por aqui, nuvens e trovões, e lobos, podem se transformar em carneirinhos que dão um pulinho indolor e se desfazem nas distâncias tantas são as possibilidades, e significados, brasilienses. É assim o inverno em Brasília. Os ventos não apenas urram, mas soluçam também tentando atravessar os inúmeros vitrais que a tornam tão irreal num jogo de luz e sombras. Uma caminhada por inesperada alameda de qualquer quadra pode mostrar espetáculo tão particular quanto público. A curva disfarçada, como quase tudo em Brasília, pode surpreender quando mostra pequeno arbusto de flores azuis ou majestoso bosque de pinheiros apontando o infinito. Tanto pode-se ver o carro mais caro do mundo, aviões descendo das alturas ou se assustar com as incríveis formas de diferentes, e tantos, e juntos, palácios, como pode-se observar ou nem perceber que um homem puxa uma carroça remendada de papelão e madeiras rotas cheia de tranqueiras. Mas há algo em comum em todas as coisas que residem sob esses celestes azuis: o pó. Como origem de tudo, e destino de tudo, o pó, em certa época do ano em Brasília, faz parte de todas as coisas e de todos os seres. Não há força natural ou humana que mude isso. Ele chega altaneiro, firme, nem sempre calado, mas também nem sempre com estardalhaço. Chega quando se dorme, quando se acorda, quando se trabalha ou se diverte; não se preocupa com conveniências nem pede licença nunca. Se instala, se empodera, se espalha nas fendas, nas lisuras, nos brilhos de mármores, nos troncos, avenidas, nos olhares... e nas flores. Os perfumes se empoeiram no inverno de Brasília; o sol se turva sob o poder do pó de Brasília. O que se dirá, então, das almas? O que salva é que flor é sempre flor mesmo que cheia de pó. Por Magda R M de Castro Brasília/DF, 03 de agosto de 2012.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

MENSAGEM NUM DIA AZUL

Azul é jeito de falar... é o céu que é azul demais em Brasília: um mar. De cabeça para baixo, mas é azul e não respinga na gente. Azul, talvez, seja por causa da manhã tranqüila, coisa rara que aproveito com gosto. Aliás, gosto é coisa que não discuto, nem é por causa dos meus que são até bem comuns, mas porque tem tanta gente no mundo e cada um com cada gosto esquisito que é melhor ficar calada. Fico, calada, mas não deixo de pensar nisso. Esquisito, aliás, foi um bicho que achei paradinho em cima de um azulejo da cozinha ontem à noite, quando fui guardar os restos de comida e botar as panelas de molho para lavar hoje cedo. Lavar louça é algo que até não desgosto tanto, mas o bicho era esquisito ainda mais que a gente aqui em casa está acostumado a ver baratas, formigas, pernilongos. Aquele era pequenino, mas estranho. Ah, aqui em casa também tem traças; e uma cadela, mas as traças tem de vários gostos. As maiores são as que vivem se enfiando nos cantos mais calmos para ler livros. E livros, os temos muitos – vou parar de escrever a gente porque me confundo na hora de conjugar os verbos, e verbos,vocês sabem é coisa sem a qual a gente, nós, escrevemos coisa nenhuma. Escrevo porque gosto, e talvez seja a coisa que mais goste de fazer hoje em dia, mas a correria – sonho com um cantinho sossegado, calado que nem o bicho esquisito do azulejo que voou antes que pudesse esmaga-lo, para poder criar alguns personagens diferentes, talvez esquisitos também - não dá tréguas. É que acredito que, para escrever, preciso de concentraçâo, e bons temas, claro. No meu caso, acho que só posso falar do cotidiano – essa palavra é bonita que só – é o que mais posso fazer. É que gostar eu gosto, mas a imaginação já está contaminada com a racionalidade com a qual preciso contar para sobreviver. Ou seja, não tenho estrutura financeira, dado que ainda preciso manter uma casa grande funcionando, e daí não posso querer ficar só por conta de escrever. Mas que gosto, gosto, sim, apesar, olha aí, da bobajada que escrevo. Então, fica o gosto, bom, de gostar de escrever sobre esqusitices e coisas nem tanto, mas até engraçadas; ou nem tanto. Por exemplo, falei de sonho, e a Clara veio me contar que sonhou um sonho bem esquisito. Disse que falava comigo enquanto eu estava recostada na cama do meu quarto, essa, muito antiga, praticamente uma amiga da família. Ela contou que enquanto conversava comigo, ela de pé, me via pelo espelho, esse pareado com a cama e atravessado na parede em frente. Ela explicou que me via recostada, mas, ao mesmo tempo, me via pelo espelho zanzando como sempre faço correndo de um lado para o outro na casa, arrumando, organizando, limpando...
Dias atrás uma ex-cunhada – e isso existe? – estava lavando a louça e me viu ensinando alguém como preparar o lixo limpo para ser reciclado. Daí, ela comentou: você continua sendo a perfeccionista de sempre? Não me ofendi, acho até que estou amadurecendo nesse aspecto - e quem me dera fosse só nesse, penso no meu traseiro - e respondi que “não sou perfeccionista, só acredito que há um jeito certo de fazer as coisas”. Sim, continuei, tenho mania de fazer discurso sobre teias de aranha, então, “acredito que se você não fizer bem feito da primeira vez, vai ter que fazer de novo, então, é melhor fazer certo logo”. Mudei de assunto, acho, mas me lembro que estava catando o lixo da casa nessa ocasião e devo ter saído da cozinha para continuar a tarefa. Mas o sonho achei que foi bem interessante ainda mais que depois – ou antes? – estávamos comentando sobre o período da adolescência que, em geral, o adolescente não quer os pais por perto, por exemplo, levando e buscando no colégio – minha filha mais velha disse que gostava de me ver chegando vestida bonitamente e esvoaçando os cabelos pelos corredores dos colégios procurando por ela. Ah, quanto procurei, esperei, conduzi e vigiei minha turma!! Era um tempo rico de eventos, de idas e vindas, de crianças lindas por toda parte...
Não é esse o tempo de hoje, é diferente, mas tem gosto e encanto também, como tudo no mundo, afinal, tem dois lados... e falando de lado, tenho que voltar para o trabalho: preparar as apostilas com os conteúdos das aulas que estão vindo por aí. É que o carnaval acabou, as visitas – queridas – foram embora, e tenho o dia de hoje para adiantar as coisas.
“Coisa” é o nome de “patrimônio”, conceito de Contabilidade que a gente estuda, melhor, estudamos em Teoria da Contabilidade, umas das disciplinas que ensino – ou aprendo?
Bem, perguntas há muitas, as respostas, bem, as respostas, assim que descobrir aviso, ah, escrevo, depois, claro, porque se continuar nessa lenga-lenga não paro de escrever nunca mais porque o que contar tenho...

Por
Magda R M de Castro
Brasília, DF, 22 de fevereiro de 2012.