quinta-feira, 29 de abril de 2010

DE AMOR E DE PORCOS

Uma das coisas que ainda não aprendi foi a lidar com o amor; não o amor paixão que esse não sei se alguém sabe mas esse amor de amor mesmo daquele tipo de amor que a gente gosta da pessoa simplesmente por ela ser o que é e daí acha que essa pessoa pode fazer qualquer coisa, qualquer coisa mesmo que você ainda vai continuar amando ela. Eu sou assim quando amo. A pessoa pode ficar longe, calada; pode me falar todo dia, maravilhoso! Pode casar, descasar, vender, comprar, que tudo o que quero é que essa pessoa ache a felicidade. E me deixar por perto para ser feliz de tabela. Para meus amores quero sempre a felicidade, e tenho certeza de que sempre a merecem, sempre. E para quem não amo também que sejam felizes... Percebi que as pessoas que eu amo fazem de mim o que elas querem. É verdade, se elas falam que a piada que contei é “feia” nunca conto mais aquela. Se me dizem para calar a boca fico o resto da vida escolhendo o que dizer. Se falam de uma roupa, se falam de minhas “más” companhias... fico sempre querendo fazer o que esses amigos acham que é melhor. Um dia, uma amiga falou que meus filhos não andavam tão bem arrumados quanto eu. É que eu trabalhava num banco e gastava um terço de meu salário com ternos e sapatos. Conseguia economizar nos “acessórios” que até uma vez um grupo de colegas me deu de presente um conjunto de bijuterias tão refinado, tão diferente, que ele até hoje parece novo em folha. Mas no dia que a amiga disse que meus filhos não andavam tão arrumados quanto eu, pensei em comprar ternos prá todos eles andarem vestidinhos assim tão arrumados nos passeios ao parque, para mergulharem nas piscinas, nas aulas de luta, nos cursos de música e língua, na escola de todo dia. Passei dias pensando quais roupas seriam mais “arrumadas” para que meus filhos andassem como se fossem executivos de bancos nos lugares que frequentavam. Dei uma olhada muito crítica nas camisetas folgadas, nas bermudas grandonas, nos chinelos, nos tênis, nos vestidos... juro que achei tudo tão errado que logo, aproveitando uma viagem de férias, fui a um setor atacadista de roupas em Belo Horizonte e botei as lojas abaixo. Fiz uma compra que levei mais de um ano para pagar, de, principalmente, vestidos lindos e modernos pras meninas e camisas de algodão que podiam ser usadas engomadas para meus meninos. Agora eles poderiam andar tão arrumados. O problema é que não perguntei para eles o que realmente os fariam confortáveis e as roupas foram doadas anos mais tarde, quase todas tinindo de novas. Viver é tão vivo, tão repentino, tão imediato que às vezes nós vamos apenas acompanhando o “rio”... e não fazemos o mundo do nosso jeito, vamos deixando que tudo ou todos interfiram nas nossas vidas. E, da mesma forma, vamos botando nosso nariz na vida dos outros. Acho que isso vem de nossa impiedosa mania de julgar; da gana burra de comparar os incomparáveis; da idiotice de pensar que as pessoas devem ser do nosso jeito. Outra coisa foi um amigo me dizer um dia que não suportava o fato de eu não falar mal de ninguém. Sim, parece esquisito, mas é que ele achava que eu era boazinha demais. E ninguém é bonzinho demais; se parecer assim deve estar fingindo. Não meu caso, esse comentário de meu amigo foi posterior a uma confusão na qual alguém me disse: “Você fala demais!”. Então, decidi que só falaria das coisas certas e para as pessoas certas. Claro que entrei em crise existencial infinita porque o que deveria ser falado foi sendo socado no chão e as coisas passaram a não se resolver mais na minha vida. Passei a viver como a Poliana que achava tudo tão lindo!! E acabou que perdi alguns anos sendo a pessoa mais perfeita do mundo enquanto esse mundo girava o meu redor e eu não via o que estava acontecendo. No dia que descobri que eu estava fazendo papel de boba foi difícil demais me fazer de novo gente: falante, inteira com meus erros e acertos. O efeito Poliana é mesmo muito grande na minha vida, até hoje. Sempre li os romances doces dos escritores românticos e quem merecia toda a felicidade o príncipe, a riqueza, o respeito, era a mocinha perfeita, lindíssima, boazinha. E coitadinha que sofreu tanto antes. Isso é arrasador mesmo quando acabei assimilando que eu tinha que sofrer horrores para merecer o paraíso. Acontece que meu jeito de ser gente, e inclusive jeito de ser desajeitada mesmo, me levou a um ponto de total confusão porque daí eu não era aquele modelo de moça, nunca tive a menor chance de ser. Entretanto, acreditei que merecia respeito mesmo assim. E que até poderia ser bem amada um dia. Fui amada, sim, uma vez. Das outras vezes, toda a consideração que recebi, olhando agora de longe, pareceu estar relacionada ao que existia ao meu redor e não propriamente por mim. E isso não é coisa que se descobre assim, levemente. Dá uma dor danada você descobrir um dia que o que você verdadeiramente, só você, na sua essência, não é interessante o suficiente para que os amores que você ama amem você do mesmo jeito; ou de qualquer outro jeito. É natural, eu diria, pessoas se afastarem. E quando isso é deliberado? Quando isso é decidido? Sim, é natural, seria sim, as pessoas têm o direito de decidir quem elas querem por perto, com quem querem se relacionar. É, falar assim não impede de isso doer. Caramba, como é triste ver que alguém que você sempre amou, admirou, não lhe dá a mínima mais. Ouvi uma vez alguém dizer que “tinha um cemitério particular”: ia enterrando as pessoas que não lhe interessavam mais na vida: questão de sobrevivência. Ai, e quando somos nós os enterrados? E, o pior, é quando você é deixada à deriva, sem responder às mensagens, sem fazer contato; o mais triste é quando você tem que descobrir sozinha que a amizade, o carinho, o que quer que tenha havido um dia se dissipou nas idas e vindas dessa vida e que você não é mais parte da vida daquela pessoa. Gosto muito de amar, gosto demais de carinho, um riso porque cheguei, um abraço porque estou indo. Amar é tão bom; mas quem inventou essa coisa de amar sozinha? O amor não é uma troca, construído por muitos anos? É, tem esse tipo de amor e tem esse outro tipo também. Sempre me volta a ideia de que nos amamos muito pouco para deixar que nossos corações sofram com o desamor. E isso tem me acontecido tanto ultimamente que estou tentando entender se estou usando meu direito de ficar sábia na maturidade ou estou deixando tudo acontecer sem participar, mais uma vez... Dúvidas ou não, o que me acontece hoje em dia é que está aumentando na minha vida o número de pessoas que eu amo e que não me ama. Parece que perdi a curva do atalho...que ia levar à felicidade que persegui toda a minha vida. Tentei tanto ser bonitinha!! Acho que fingi, porque afinal descubro que não é fácil assim ser amada. Eu estava enganada sobre o amor... estou sim porque ele continua ao meu redor, o apalpo vez ou outra, o vejo belo e altaneiro nos meus sonhos insistentes... mas, não tem muita gente interessada nisso mais não. Concluir assim me faz pensar sempre na frase “jogar pérolas aos porcos”... que também não é tão interessante. E seria interessante se o dito fosse “defunto atira pérolas aos porcos”? é feio isso, feio que só, mas estou ligeiramente desconfiada de que alguém andou me enterrando por esses dias passados. Recentemente, eu diria...e fico então pensando, o que a gente faz com estoque de amor? Será que perde a validade? Por Magda R M de Castro Brasília – DF, 30 de abril de 2004.

BRASÍLIA 50 ANOS

De verde seiva era seu cheiro
De vermelho sangue seu céu
Em terra rubra aberta sua alma
Assim como eu, e tantos, começava.

Vinha de caminhos antigos
De outros amores construída
Assim como cheguei, eu e outros tantos,
Em ti para viver a vida.

De veias vermelhas, negras romperam
Levando, conduzindo, trazendo
De braços, de corações, de coragem
Seus moldes estátuas e viagens.

Do ventre da terra seu grito se elevou
Sua alma bradou
Seu espectro se fez
Assim como eu, e tantos outros,
o grito da vida despertou
De nós duas, almas vencidas, vidas unidas.

Eis nesse vale o amparo
Eis nesse planalto a paz
A alegria da chegada festiva
E dos dias, e noites, de construção,
à deriva: tu e eu, e tantos ainda.

De brados e ventos vieram
Tantos lamentos
De tantos recantos e paragens
Chegou a ti o pobre, o rico,
O sábio, outros nem tanto,
Mas de ti, todos tiveram, em igual medida, a esperança.

Capital já nascia; capital assim seria
A platina a chamar em seu alvo brilho
Em-canto de sereia do cerrado
Do mais remoto rincão, do afastado
Trouxe o riso, o ciso, o viço
Que em teu regaço aconchegou
Tanta vida, tantas, e também eu.

E mesmo que a saudade de outros planos
Tenha um dia vindo bafejar seu esplendor
Para sempre aqui fiquei, como tantos...
E jamais de ti parti, como muitos
Tantas vindas: porque em ti
Em teu regaço doce
Em teu frescor de nascentes assombreadas
Me deleito, e os demais, filhos adotivos ou naturais
ou comensais
De tanta fartura, mel, doçura
A mais fina semente germinada
A mais fria alma desencantada
Que em ti renasce e floresce
Porque tua alma, na minha, e na de todos nós,
jamais fenece.

Eis, então, que de sonho um dia hoje é verdade,
Eis, que tua esperança se torna viva
Eis, que em sua história sem par,
O lugar,
Eis, que chega, em esplendor ao palco da maturidade.
Ainda juntas, tu e eu, e junto a tantos
Que em ti renasceram,
Eis, que presenteia com beleza.
E agora também com nobreza,
A sua gloriosa grandeza.

Nobre, bela, doce, eterna,
Tu és o paraíso para tantos,
E eu, como outros
Fomos duas jovens que juntas
Enfrentaram o próprio destino e o venceu.
Escrevemos nosso enredo, tu e eu, e tantos mais
E agora, festejas, prova teu valor , teu apogeu
Como berço de nova era.
É tão forte, tanto que outros milhares tantos desse vai contar
E eu, como último apego que me cabe
E posso,
Quero em seus campos suaves
Descansar em leito eterno...
... como tantos...

Por
Magda R M de Castro
Brasília, DF, 29 de abril de 2010.