domingo, 21 de setembro de 2008

UMA MULHER BEM AMADA

Depois de um show, minha filha artista pegou os programas que sobraram para colher mensagens dos amigos e guardar de lembrança. Mania que herdou de mim, guardar lembranças delicadas como se fossem pequenos pedregulhos marcando o caminho percorrido.
Uma das mensagens que recebeu foi a do namorado, recente assumido como fazendo esse papel na vida dela. Não foi uma mensagem piegas, ou copiada de poeta, disso nem sombra, aliás. Como sou viciada em leitura, deu para ver que era original o elogio, criativa a forma que usou, simples, mas não menos certeira, a declaração escrita, ora com palavras salientes mostrando que escreveu por cima muitas vezes, para reforçar talvez, ora com letra fina e clara.
Eu tinha os olhos lacrimejantes quando terminei de ler a mensagem desenhada entre os vazios do folder do show. Aquela era uma boa lembrança para guardar: preciosa, valiosa. Comentei com minha caçula que a vida tem o milagre de nos permitir tocar os nossos sonhos mais profundos, se não por os vivermos, mas por vermos que nossos filhos os alcançaram.
É que foi meu sonho a vida toda encontrar alguém que me lesse sem que eu mesma fosse capaz. Tolice, talvez, mas para mim, me entender tinha o significado de interesse profundo, transparência de intenções, sinceridade. Fui uma mulher que procurou dar o espaço necessário às pessoas, permitindo que cada uma vivesse de acordo com as próprias convicções e capacidades, e sentimentos verdadeiros, mesmo que isso as afastasse de mim.
Então, olhando para minha filha naquela manhã, transformada de menina birrenta em mulher serena, e sendo definida pelo namorado naquela mensagem, me emocionou demais e fez valer tudo. Ela respondeu ao meu comentário dizendo que tinha encontrado um bom homem, o que todas concordamos na hora. Durante a maratona dos shows, tanta coisa para arrumar, a gente em casa correndo como baratas tontas para cuidar dos afazeres corriqueiros e desses agora, extras, o namorado foi grande. A assistência que deu à debutante no mundo dos espetáculos musicais foi de tirar o chapéu. Ajudou a vender ingressos, divulgou e levou amigos, família, colegas de trabalho. A ajudou carregando mala de apetrechos e caixa de isopor com água e suco; estava na platéia no começo e no fim das apresentações; vibrava com as notas que a cantora distribuía do palco; e esperou, todas as noites, que ela arrumasse a tralha para trazê-la de volta para casa, não importava o quanto demorasse. E, no final, lhe escreve lindas palavras.
Todo mundo correndo também pra lá e para cá, ajuda aqui e ali: a irmã, a babá e eu, todos combinando só ajudar caladas, sem dar palpite, só seguindo os passos da artista, para que tudo desse certo, então, a ajuda do namorado foi importantíssima.
E o show deu certo, foi show mesmo, a semente como comentamos depois, de carreira brilhante. A semente, o começo, o lançamento, depois de longa jornada, de trabalho, de esforços, de desencontros, brigas até. Tinha dias em que a moça parecia ligada na tomada. Isso não só agora, mas no decorrer de sua vida até aqui diante de tantos obstáculos e dificuldades, natural, mas ela era muito, mas muito mesmo, cabeça dura: fazê-la mudar numa coisa era trabalho de Hércules.
Então, aconteceu: o amor fez dela criatura suave, de chamar para conversar e pedir opinião. Aceitou o conselho da irmã a respeito do cabelo, deu espaço para as pessoas mostrarem também o próprio brilho, soube esperar pelo seu momento. Soube esperar pelo seu amor também: o primeiro namorado, de verdade, aos 18 anos é coisa rara hoje em dia. Ela esperou.
Como vem esperando os momentos certos para as decisões mais profundas. Esperou pelo melhor, não aceitando o meio-termo, nem o morno, nem o mais-ou-menos. Estreou o show, com tudo que tinha direito: mostrou no palco o resultado de trabalho árduo e disciplinado, mas com a serenidade de um coração preenchido, de uma alma que chegou, de alguém completo. Sua expressão, no show e depois dele, é de quem confia, em si, principalmente.
Isso é obra do amor. Foi preciso mundos e fundos para fazer dela uma mulher feliz? Não. Presença, sinceridade, entendimento, apoio em momento importante; valores que batizaram pessoa nascente: nova mulher, bem amada.

Por
Magda R M de Castro
Brasília, DF, 10.09.08

Um comentário:

Leonardo Avelar disse...

Lindo texto! Adorei...
Acabou que nem comentei com a senhora ontem, mas gostei muito, aliás, dos dois últimos textos.
Obrigado pelas palavras e pela forma como todos têm sempre me recebido nessa família da qual já me sinto parte. De verdade!

Um grande Beijo!

E bom dia! =0)


Leo